Monday, January 08, 2007

Filosofia revelada

Havia, na Copenhague da primeira metade do século XIX, um certo Johan Ludvig Heiberg (1791-1860), escritor, historiador, teatrólogo e crítico de arte de grande expressão local. Era filho de escritores e casou-se com uma atriz. Inicialmente o filósofo Kierkegaard mantinha boas relações com ele, até o momento em que publicou sob pseudônimo o livro "Ou, ou" e a comunidade local julgou que Heiberg fosse o autor. Heiberg, para negar com veemência a autoria, disse que jamais escreveria "um livro monstruoso como aquele". Quando Kierkegaard publicou "A Repetição", novamente sob pseudônimo, Heiberg outra vez deixou claro que não era o autor e que o livro não tinha qualquer valor. Mas a briga se tornou mais acirrada quando, em um belo dia, Heiberg "acordou hegeliano".

A julgar por Kierkegaard, Heiberg, em uma bela manhã de Páscoa de 1822, "levantou-se para compreender a filosofia de Hegel". Tivera, em sonhos, a revelação da filosofia hegeliana. A partir de então tornou-se seu grande apóstolo.

Apesar da ironia, parece que Heiberg realmente alegou ter tido a comprensão de Hegel como se fosse uma revelação.

Mais tarde, a esposa de Heiberg representou Julieta, aos quarenta anos, na peça de Shakespeare, e Kierkegaard não deixou por menos: publicou um artigo sobre a peça, intitulado "A Crise e a Crise na vida de uma atriz" (1848), em que afirmava que somente na maturidade a atriz poderia de fato representar Julieta, porque a lembrança de sua juventude não estava disponível nas performances... da juventude.

Trocando em miúdos: a sra. Heiberg está velha para o papel de uma jovenzinha de 15 anos, mas isso não é problema porque podemos nos lembrar dela quando jovem, ou imaginar como teria sido, o que seria impossível quando ela era jovem.

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