Wednesday, May 11, 2005

Como ser o bam-bam das reuniões

Não sei por que, mas sempre que compareço a reuniões, sinto uma vontade inexplicável de martelar furiosamente um teclado. Escrevendo.

Hoje, no entanto, meu espírito é de infinita bondade (resultado talvez do cansaço que a tal reunião me impôs): pensando unicamente no bem de todos e felicidade geral da nação, resolvi criar algumas regras de participação em reuniões.

É claro, ninguém vai segui-las e ainda me faltará o espírito democrático (já que não foram previamente discutidas em reuniões). Mas a gente tenta, assim mesmo.

Comecemos por uma regrinha fundamental: encontre uma boa desculpa para sair mais cedo. Não será necessário ouvir tudo.

Isso é difícil, né? O desejo de contribuir fala mais alto. Tudo bem, eu entendo. Por isso preparei um plano alternativo:

1. Comece por criar uma teoria da conspiração, mas seja esperto o bastante para não dar margem a questionamentos inconvenientes. Apenas sugira que as coisas não são tão simples quanto parecem. O resto caminha sozinho. Daí a pouco todo mundo estará raciocinando do mesmo jeito e ninguém saberá dizer onde está a conspiração. Pero que hay, hay.

2. Não tenha pressa em falar. Pelo contrário, esforce-se para ser o último. Só assim poderá dizer que, após ouvir atentamente os posicionamentos anteriores, você gostaria de ressaltar que... E o resto é com você. Seja criativo, fique atento e pesque algo que passou despercebido. Seja lá o que for que vá dizer, seu discurso já terá um ar de síntese e, portanto, estará automaticamente um grau acima de todos os pontos de vista particulares. Nunca parecerá mais uma inutilidade perspectivada.

3. Use “a nível de” tantas vezes quantas for capaz. Isso é bastante satisfatório tanto a nível de convencimento quanto, e principalmente, a nível de persuasão.

4. Nunca se esqueça de diagnosticar o caráter demasiadamente epistêmico dos comentários dos colegas, mas procure fazê-lo sem demora, senão outro o fará. A rapidez de raciocínio aqui é decisiva para o sucesso.

5. Esclareça que qualquer alteração na rotina (por exemplo, a mudança da sala A para a sala B, ou do prédio A para o prédio B) só pode ser feita a partir de uma discussão cuidadosa de todos os aspectos filosóficos, teológicos, humanistas, antropológicos e, por que não dizer?, democráticos envolvidos na questão, que estabelecem uma diferença significativa entre a sala A e a sala B e, numa dimensão maior, entre o prédio A e o prédio B.

6. Demonstre a gravidade da situação de indigência intelectual do país (por exemplo, criando uma lista interminável com os erros de português horrendos que os universitários cometem) mas peloamordedeus, nunca, jamais, em tempo algum o faça com um português pra inglês ver. Sim, eu entendo que o porquê disso acontecer é devido o descaso sofrido pelas disciplinas de humanidades a nível de mundo, enquanto sujeitas ao caráter pragmatista, ideológico e mercadológico do mundo de hoje. Certo, mas dê uma melhoradinha nisso aí, tá? E vê lá se não vai melhorar o discurso acrescentando um Zeitgeist bem pronunciadinho. Não é por aí não.

7. Deixe sempre muito claro que você está falando de você enquanto você, e somente enquanto você. Isso é para evitar que alguém entenda que está falando de você enquanto todos.

8. Insista veementemente no chavão do espírito democrático: as decisões arbitrárias devem ser impostas às novas gerações, não a nós. Isto seria mais democrático, sem dúvida (mas como assim, cara pálida?).

Siga minhas regras e seja um feliz e bem sucedido participante de reuniões. Vá por mim, ela funcionam.

Mas o fundamental é não perder jamais o ar de menino ressentido diante da autoridade, porque o pai tomou decisões que o envolvem sem antes consultá-lo. Afinal, filósofo também é ser humano, né?

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