Monday, April 30, 2007

Tentativa e erro

Ouço com frequência dois argumentos em defesa de crenças:

1. Minha crença é verdadeira porque é milenar.
2. Minha crença é verdadeira porque todos os povos antigos, sem exceção, têm registros de crenças semelhantes.

Os dois argumentos se utilizam de recursos quantitativos, o que por si só já os desqualifica. Qualquer crença só poderia ser validada, se isso fosse possível, por recursos qualitativos, ou seja, dizendo-se porque ela é verdadeira, e não dizendo que é verdadeira porque muitos acreditaram em sua verdade.

Ainda assim, há diferenças entre os dois argumentos. O primeiro defende que a verdade de uma crença se assenta sobre a sua antiguidade. Ora, a humanidade não poderia, por quaisquer razões, fazer perdurar um erro? Não foi assim com a crença da ciência na idéia de geração espontânea, que perdurou até o século XVII? Não se teve como certo, até a modernidade, que o sexo feminino é uma inversão anatômica do sexo masculino, porque seus corpos não se desenvolveram como os dos homens? Não há um sem-número de "verdades científicas" que sobreviveram a séculos de engano? Sendo assim, o argumento da antiguidade não procede.

O segundo argumento apela para a sincronia entre crenças antigas, mas é igualmente improcedente. Diz-se que a prova da existência de um outro plano, espiritual, está na recorrência desta crença entre os povos antigos. Mas isto não poderia ser apenas a expressão de inquietações semelhantes, que são parte da natureza humana, de sua capacidade de compreender a finitude? É claro que poderia. Portanto, este argumento também não procede.

No fim das contas, não há argumento consistente em defesa de necessidades pessoais, ainda que elas se expressem universalmente ou historicamente.

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