Monday, May 07, 2007

Imortais (2): Paradoxo cretense

Epimênides era um poeta cretense de pouca expressão. Tornou-se conhecido da posteridade por uma única frase:

"Os cretenses nunca falam a verdade".

Epimênides era cretense e afirmava que os cretenses nunca falam a verdade. Então esta frase não é verdadeira, o que significa que os cretenses sempre falam a verdade. Mas, se os cretenses sempre falam a verdade, então Epimênides dizia a verdade ao afirmar que os cretenses nunca falam a verdade e, se isto é verdade, então é uma inverdade, e assim por diante.

1 comment:

John said...

Olha isso:

O paradoxo é apenas aparente. Isto porque o raciocínio nele vertido não é válido. O enunciado é construído de tal modo a provocar uma revolução veritativa sobre si mesmo quando enunciado por um cretense. Isto porque, se é verdade que todo cretense sempre mente, o cretense que faz essa afirmação estaria a dizer a verdade (premissa adotada para todo o enunciado), donde, pelo um crentense não mentiria sempre. Por outro lado, aplicado o conteúdo do enunciado sobre o cretense que o profere, tendo ainda por premissa a veracidade da sentença, então ele estaria mentido, donde, não ser verdadeira sua afirmação, do que se conclui que algum crentense nem sempre mente. Qualquer que seja o caminho trilhado chega-se à conclusão de que existe pelo menos um crentes que nem sempre mente, ou existe algum cretense que nem sempre mente. Esse enunciado categórico particular demonstra apenas que o enunciado categórico universal de que se parte é falso, o que está em perfeita consonância com as regras da lógica.

Com efeito se observarmos com mais acuidade, veremos que o problema parte de uma premissa postulada sob a forma de um enunciado categórico universal. "Todos os cretenses sempre mentem". A falsidade desse enunciado não implica afirmar que "todos os cretenses sempre dizem a verdade" ou que "nenhum cretense mente" ou que "todos os cretenses nunca mentem", os quais seriam expressões do enunciado contrário. Não, a falsidade da premissa "todos os cretenses sempre mentem" implica poder afirmar tão somente que "nem todos os cretenses sempre mentem".

Para chegar a essa conclusão basta verificar a analogia que guarda com o seguinte enunciado: "tudo é preto", cuja falsidade implica que "nem tudo é preto" ou "alguma coisa não é preta", o que é muito diferente de dizer que "tudo não é preto". Basta que a cor de alguma coisa seja diferente de preto para que aquele enunciado seja falso. Não é necessário que a cor de alguma coisa seja branca, que é o contrário de preto, para afirmar a falsidade do primeiro enunciado. Qualquer que seja a cor de alguma coisa, desde que seja diferente de preto, tornará o primeiro enunciado falso.

Assim revela-se que o paradoxo do cretense não passa de pura aparência, pois tal afirmação, quando proferida por um cretense, causa uma revolução veritativa sobre si mesma, conduzindo a um absurdo, o que demonstra ser ela própria uma afirmação falsa. Isto é, conduz à ilação de que existe algum cretense que nem sempre mente. Essa conclusão reflete-se sobre ele próprio, de modo que não é possível saber se está mentido ou não, mas apenas que sua afirmação é falsa. A solução do paradoxo, com a qual temos de nos contentar é de que o enunciado categórico universal "todos os cretenses sempre mentem" é falso, e disso não se pode concluir nada além de que existe pelo menos um crentense que nem sempre mente.

(a) Sérgio Niemeyer