Tuesday, January 30, 2007

Leis da filosofia

Dizem que a filosofia é regida por duas leis:

1a. Lei: Para cada filósofo, há outro igual e oposto.

2a. Lei: Ambos estão equivocados.

Ignoro o autor.

Monday, January 29, 2007

O dia em que a Bélgica acabou

Durante dois meses, a RTBF, emissora de TV belga, preparou-se cuidadosamente para noticiar que a independência da região de Flandres, de língua holandesa, havia sido aprovada pelo Parlamento. Perder Flandres significaria o fim do país.

O objetivo era provocar a discusão sobre o futuro da Bélgica, mas a coisa toda foi tão bem arquitetada que ninguém duvidou da notícia.

Antes que pudessem desmentir a informação e explicar o propósito da "pegadinha", o caos já havia se instalado no país.

No fim das contas, a RTBF só conseguiu gerar pânico e perder a credibilidade.

Brincadeira besta.

Saturday, January 27, 2007

Incapacidade de contar carneirinhos

Insônia não é meu forte, mas durante a infância era obrigada a dormir muito cedo. Como o sono às vezes demorava a vir, me ensinaram a contar carneirinhos.

Tentei. Lá vinham os carneirinhos, pulando a cerca: um, dois, três, quatro... e de repente um deles pulava mal a cerca, caía de mau jeito e quebrava a patinha.

Pronto! Agora eu tinha um problema: mal começava a contar, um carneirinho estragava tudo, e eu só ficava pensando no carneirinho caído, enquanto os outros continuavam pulando e eu perdia a conta. Se tentasse apagar tudo e começar de novo, lá vinha o bichinho tonto outra vez. Às vezes os outros tropeçavam no carneirinho caído e caíam também. Era uma tortura. :))

Mesmo assim, fazia todo sentido para mim um carneirinho cair. É claro que não são todos iguais, né? Não existe no mundo um único rebanho de carneiros iguaizinhos. Claro que um é mais magrinho, outro é mais gordinho; um é mais ágil, outro nem tanto... Então é obvio que nem todos vão pular a cerca com a mesma destreza, né?

Pois então.

Thursday, January 25, 2007

Gralha?

Às vezes os livros editados em português de Portugal me confundem. Lembro que, na adolescência, lia uma historinha policial, escrita em português de Portugal (ou traduzida, não lembro), em que lá pelas tantas o personagem-narrador dizia que "havia uma bicha enorme em frente ao banco". A frase soou tão fora de propósito que não esqueci. Mais tarde descobri que "bicha" é apenas "fila".

Coisas de quem ainda está descobrindo o mundo.

Pois é. Eis que hoje, vasculhando as Confissões de Rousseau em busca de informações sobre as "Cartas a D'Alembert", esbarro na seguinte frase, que cito exatamente como está: "Esse barão era filho de um homem que havia trepado, e gozava de uma enorme fortuna, de que dispunha nobremente, recebendo em sua casa gente de letras e de merecimento, de que não desdizia graças ao seu saber e às suas luzes" (Lisboa, Relógio D'Água, vol. 2, livro oitavo, p. 95).

Então. Parei aí. O que terá feito esse homem, afinal de contas? Será que é apenas cochilo da revisão, em um livro tão bem acabadinho, tão bem revisadinho, apesar de bastante extenso? Será apenas uma tradução mal feita? Ou será isso mesmo e "trepar" tem um significado que só os portugueses entendem?

É claro que o significado, digamos, brasileiro está fora de questão. Primeiro, porque é um termo grosseiro demais para estar em um livro de filosofia. Segundo, porque isso certamente não seria tão relevante, a ponto de Rousseau incluir a façanha em suas Confissões. Terceiro, porque a afirmação seria, nesse caso, absolutamente desnecessária, já que o tal barão é filho do tal homem.

Não, não. O significado é outro, mas ainda oculto para mim.

Então pensei: será que ele subiu em uma árvore? Mas que importância isso teria, né?

Sim, procurei o verbete em um dicionário online de português de além-mar, mas não encontrei nada esclarecedor.

Continuo na ignorância.

Wednesday, January 24, 2007

Século misógino

Nós sabemos bem que a misoginia sempre esteve presente em todas as épocas, mas é particularmente presente no século XIX. Grandes pensadores do período, como Nietzsche, Freud, Schopenhauer, Kierkegaard, só para citar alguns, fizeram comentarios depreciativos sobre as mulheres em seus escritos. George Sand vestia-se como homem. As heroínas da literatura, via de regra, eram mulheres que traíam os maridos (Madame Bovary, Ana Karenina), prostitutas (Moll Flanders, a Sonja de Crime e Castigo, Bola de Sebo, A Dama das Camélias), bibelôs (a primeira mulher de David Copperfield, por exemplo), más (como a Marquesa de Os Três Mosqueteiros ou a amada de O Idiota, de Doistoievski), fálicas e ressentidas (como a heroína de A Herdeira, de Henry James), interesseiras (como a amada de Pip), reprimidas sexualmente (como a babá de A Volta do Parafuso), ingênuas (como a heroína de Guerra e Paz) ou servis (como a florista de Pigmaleão).

Eis alguns comentários de filósofos da época sobre as mulheres:

De Nietzsche:

"Quando as mulheres lutam por conquistar direitos iguais aos do homem, isso é um sinal de doença; qualquer médico o sabe"
"A mulher é uma superfície que tenta imitar a profundidade".


De Kierkegaard:

"Quando a mulher comete um grande feito, admiramo-la mais do que a um homem, por não ser de modo algum isso que dela seria de esperar".
"Quando Sócrates agradece aos deuses por ser grego e não bárbaro, tenho de concordar com ele. Quando agradece aos deuses por ser livre e não escravo, novamente estou de acordo. Mas quando agradece por ser homem e não mulher, aí sim estou inteiramente com ele".


De Schopenhauer:

"Pueris, fúteis e limtadas; permanecem a vida inteira crianças crescidas, uma espécie intermediária entre a criança e o homem".
"As mulheres são seres de cabelos longos e idéias curtas".


Li em algum lugar que um grande filósofo é póstumo. Bem, não tanto assim. Lá estão os valores da época puxando-os de novo para o mundo dos mortais.

Monday, January 22, 2007

Piedade horrenda

Uma experiência do passado, mas ainda marcante:

......

Estava em um bar, em uma das primeiras mesas, logo à entrada, de onde podia observar os passantes. Uma chuva fina caía incessantemente, esfriando a temperatura. Em determinado momento avistei, do outro lado da rua, um garoto caminhar, carregando uma grande caixa de papelão. Perguntei-me por que estaria carregando a caixa e se haveria algo dentro dela. Parecia leve, à distância, embora fosse muito maior que ele.

Acendi um cigarro e voltei a atenção novamente para os amigos com quem dividia a mesa. Mais um pouco, e notei que o garoto estava agora deitado na calçada molhada e, tendo aberto a caixa vazia, protegia-se da chuva com o papelão.

Outra cerveja sobre a mesa, outro cigarro, sem desviar a atenção do garoto. Manifestei o desejo de falar com ele e os amigos tentaram demover-me da idéia. Claro que a situação de abandono do menino incomodava, mas ir falar com ele...

Pedi a conta. Podia não haver justiça social, mas devia haver algo que se pudesse fazer por aquela criança em particular.

Atravessei a rua e aproximei-me da criança. Estava coberta pelo papelão que, embora grosso, já se ressentia dos pingos de chuva. Ajoelhei-me a seu lado, sem escutar os conselhos dos amigos, e puxei o papelão para ver seu rosto. Perguntei-lhe, estupidamente, o que estava fazendo ali, por que não tinha ido para casa, se tinha fome. Ele não se moveu e toquei seus cabelos, sujos de terra. Afastou a cabeça abruptamente, mas insisti em afagar seu rosto, pedindo-lhe que falasse comigo. Queria conversar com ele, saber sua história, ouvir suas queixas. Ajudá-lo.

No entanto, o garoto mantinha-se de olhos fechados, ignorando-me por completo. Disse-lhe então que, se não queria falar comigo, devia ao menos estender a mão para que eu colocasse nela algum dinheiro.

Ao me ouvir, ele se voltou e abriu os olhos. Encarou-me. Seu olhar era de profundo ódio, como se eu o tivesse ofendido por querer dar-lhe dinheiro. Um momento apenas, um instante em que me vi impossibilitada de ser boa a meus próprios olhos, porque ele não me permitiria sê-lo.

Entretanto, o bom senso havia me abandonado completamente. Era uma apenas uma criança. Eu não devia me deixar intimidar. Devia fazê-lo entender que só desejava ajudar. Poderia dar-lhe algum dinheiro, o que talvez fosse de mais valia para mim do que para ele, mas eu tinha de fazer alguma coisa, mesmo que ele não quisesse. Era imperioso deixá-lo certa de que havia ao menos tentado ajudar.

Insisti, quando voltou a fechar os olhos e dar-me as costas. Não ia entender que eu precisava ajudá-lo? Não compreenderia que precisava de minha ajuda?

Numa determinação rara em mim, segurei sua mão com força e tentei abri-la, para colocar nela uma nota. Ele a mantinha fechada, forte, determinada, num gesto que refletia toda sua disposição a meu respeito.

Travamos uma nova luta silenciosa, desta vez para que ele abrisse a mão e recebesse minha oferta generosa: uma nota que, afinal, talvez lhe pagasse muito mais que o jantar e o ônibus para casa.

Não demorei a perceber que perderia também esta batalha. Tratava-se apenas de uma criança, mas tão consciente do que não queria, que resolvi não forçá-lo mais.

Toquei seus cabelos novamente, acariciei seu rosto e disse-lhe que ia deixar a nota a seu lado. Se não a quisesse, que a jogasse fora, mas era dele.

Ao afastar-me, a única coisa em que pensava, em que conseguia pensar, era na necessidade de lavar as mãos.

Afinal, tinha tocado em um menino de rua.

Sunday, January 21, 2007

Curso de milagre

Gostaria de realizar milagres? Acha que nasceu para algo mais que crescer, procriar, trabalhar e morrer? Deseja ser santo? Quer ser adorado?

Ora, por que ficar só na vontade? Agora você pode!

Acabou de chegar ao mercado um novíssimo curso que o habilitará a tudo isso: é o curso de milagre! Trata-se de algo inovador, inusitado, de vanguarda mesmo, com lista de exercícios, livro-texto, manual do professor, tudo novíssimo, profundidíssimo, e ainda por cima escrito com o "ideal Divino".

Mas não se entusiasme demais. Querer é poder, mas nem por isso será uma tarefa fácil ler os tais livros. É que são os livros "mais profundos" e "mais difíceis" que o autor escreveu, ou leu (isso não está claro), embora estejam no "topo dos três livros" que o autor, ou leitor, leu ou escreveu. Note bem: no topo dos TRÊS livros que escreveu - ou leu - até a presente data. Como os TRÊS livros citados estão no topo dos TRÊS livros lidos, ou escritos, por um autor (ou leitor) que não é lá muito versado em ambiguidades, é de se considerar que os três livros sejam mesmo confusos e difíceis de serem lidos - ou escritos.

Tudo bem, se quer aprender a realizar milagres, eis aí uma boa oportunidade. Mas procure não exigir demais. Jamais se pergunte, por exemplo, como é que três livros dos três livros lidos até então podem estar no topo dos mesmos três livros.

Apenas confie e siga em frente.

O que a lógica tem a ver com isso, né?

Saturday, January 20, 2007

Peripécias de Rousseau (1): Therèse

Que Rousseau é o Tom Jones (de Fielding) da filosofia, não há a menor dúvida. Apesar de ter tido várias amantes que o sustentavam, viveu boa parte de sua vida com uma certa Therèse le Vasseur, uma mulher sem atrativos, analfabeta e gananciosa, a quem diz não ter amado um só dia de sua vida. Chegou a casar-se com ela, após mais de duas décadas de convivência. Therèse e sua mãe viveram às custas de Rousseau, que vivia às custas de madames. O filósofo a ensinou a ler, mas não a escrever, provavelmente porque tinha receio de que ela o superasse de algum modo. Tiveram cinco filhos, e Rousseau "doou" todos ao Estado: abandonou-os logo após o nascimento na roda dos excluídos. A explicação para isso também é singular: ele percebeu que, se criasse os filhos, seria apenas "Jean-Jacques". Jamais seria "Rousseau".

Friday, January 19, 2007

Amar é... (4): ...ter a quem culpar

Em 1764 o filósofo Jean-Jacques Rousseau resolveu escrever suas Confissões e deixou amigos e inimigos em pânico, tentando impedir a publicação da obra. De alguém como Rousseau, podiam esperar todo tipo de indiscrição. Para piorar, atreveu-se a fazer leituras públicas das Confissões. Mas, embora houvesse de fato inúmeras indiscrições nos relatos de sua vida, o alvo principal de Rousseau era suas próprias mazelas. Mesmo assim, não dá para admirar sua coragem, ou sua franqueza, ou sua capacidade de avaliar a si mesmo, porque todo o relato é eivado de um certo encantamento consigo mesmo e uma capacidade infinita de distorcer os fatos em um auto-engano bastante conveniente.

Uma das piores histórias das Confissões, senão a pior, revela o caráter dúbio de Rousseau, condizente com a escola romântica, da qual é o primeiro representante, e com o cristianismo:

Rousseau vivia de expedientes. Um deles era o de viver o tempo que fosse possível sob a tutela de uma amante rica. Entre elas houve uma certa Madame de Vercellis. Enquanto vivia em sua casa, apaixonou-se por uma serviçal, Marion. Três meses depois Madame de Vercellis faleceu e Rousseau, novamente sem destino, surrupiou "uma fitazinha cor-de-rosa e prata já velha". Uma coisinha de nada, que a morta não haveria de querer, e que o ajudaria a sobreviver até encontrar outra madame.

Bem, os herdeiros deram por falta da fita e a encontraram com Rousseau. Confrontado com os fatos, não hesitou: acusou Marion do roubo; disse que ela lhe havia dado a fita. Ele conta: "[ao acusá-la, Marion] deitava-me um olhar que teria desarmado o demônio, e a que o meu bárbaro coração resiste".

Mas isso não é tudo. O pior na história toda é a desculpa que Rousseau dá a si mesmo por ter agido tão mal: "Nunca a maldade esteve tão longe de mim como naquele cruel momento, e quando acusei a infeliz rapariga, é singular, mas a verdade é que o fiz por amizade para com ela. Tinha-a presente no pensamento, e desculpei-me com o primeiro objeto que se me ofereceu".

Em outras palavras: Rousseau amava tanto a mocinha que, ao procurar a quem culpar, só vinha à mente o nome dela, porque não pensava em ninguém mais.

Wednesday, January 17, 2007

Amar é... (3): ...culpa de Eros!

Jasão - aquele, dos Argonautas -, em sua viagem em busca do velo de ouro que lhe garantiria a posse do trono que lhe era devido por direito, casa-se com uma feiticeira, Medéia, que leva para a Grécia, e tem com ela dois filhos. Quando torna-se possível casar com uma grega, filha de Creonte, rei de Tebas, Jasão não hesita: precisa se livrar da mulher. Segundo a peça de Eurípides, Medéia, Jasão quer que seus filhos sejam criados como príncipes, e não como filhos de uma estrangeira. Enfim. Jasão despreza Medéia e quer tomar-lhe os filhos. Quando ela se dá conta das intenções de Jasão, toma uma decisão digna, na concepção dos gregos, de bárbaros: mata os dois filhos para vingar-se do marido.

Quando Jasão vai buscar os filhos e descobre que estão mortos, tem uma discussão com a mulher, o melhor da peça.

Primeiro, eles se acusam mutuamente pela morte das crianças:

JASÃO: Ó meus filhos, que monstro encontrastes em vossa mãe!
MEDÉIA: Ó meus filhos, foi a perversidade de vosso pai que nos perdeu!
JASÃO: Ao menos, não foi meu braço que os imolou.
MEDÉIA: Foi teu ultraje.
JASÃO: O quê? Foi para vingar teu leito que te resolveste a matá-los? (...)
MEDÉIA: Sabem os deuses quem foi o primeiro autor deste desastre.
JASÃO: Sim, eles sabem todo o negror de tua alma.


Em seguida, discutem sobre quem realmente amava os filhos:

JASÃO: Ó meus filhos queridos!
MEDÉIA: Queridos por sua mãe, não por ti.
JASÃO: E no entanto os mataste!
MEDÉIA: Para te desesperar.


Depois, sobre o direito de enterrar as crianças:

JASÃO: Deixa-me enterrar meus filhos e chorá-los.
MEDÉIA: Certamente que não. Sou eu que os enterrarei com minhas mãos.


Por fim, Jasão quer se despedir dos filhos, e Medéia o impede:

JASÃO: Em nome dos deuses, deixa que eu toque o corpo encantador de meus filhos!
MEDÉIA: Não, tua súplica é inútil.


Mas o mais interessante é a desculpa de Jasão para ter-se envolvido com Medéia:

MEDÉIA: Ó mais celerado dos homens! (...) Eu te salvei a vida.
JASÃO: (...) Reconheça comigo - a explicação não é engenhosa, se bem que pouco apropriada para te agradar? - foi Eros que, ferindo-te com suas flechas invencíveis, te forçou a salvar-me.


Jasão quer se livrar da mulher, tomar-lhe os filhos e deixá-la desamparada, já que não pode voltar para sua terra, nem poderia ficar na Grécia.

Quando Medéia o acusa de ter uma dívida com ela, por tê-lo salvo a vida (às custas de matar o irmão e trair o pai) e por tê-lo ajudado a reaver seu direito ao trono de Iolco (ao matar o tio de Jasão), o marido lhe diz, nas entrelinhas, que não lhe deve nada, porque tudo que ela fez foi por amor a ele, Jasão, e que este amor nada mais era que uma travessura de Eros. Ela havia sido enfeitiçada pelo deus do amor. Logo, se alguém tem alguma culpa, esse alguém é Eros.

Eitcha! Quase acreditei na inocência de Jasão.

Tuesday, January 16, 2007

Pois é, prá quê

Se há uma coisa aí que realmente me encanta na língua portuguesa, especialmente a falada, é a total flexibilidade do aí.

Ninguém ignora aí que o aí é usado no início da frase (p. ex, aí eu disse...), no meio (p. ex., o que se pode dizer aí sobre o uso indiscriminado...) e no final (isso é tudo que se pode dizer aí). Uma espécie de próclise, ênclise e mesóclise frasal. Não é lindo?

É bom lembrar que a filosofia também gosta de um aí: ser-aí; aí-presente etc.

Mas, apesar de encantada, não posso me furtar de dizer aí que não tem sentido aí esse aí aí. É que o aí está mal empregado aí. Não é o caso aí de se usar um advérbio de lugar aí porque não há lugar algum aí. Ou há e eu é que vi?

Em todo caso, será que não dá prá parar aí de usar o aí?

Monday, January 15, 2007

Injustiça literária

Shylock era um judeu que, na peça de Shakespeare O Mercador de Veneza, vivia em um gueto nos arredores da cidade. Para sobreviver, emprestava dinheiro a juros, e juros altos. Um bom cristão, dono de navios que faziam rotas comerciais, pede-lhe dinheiro emprestado para ajudar um amigo, que quer se casar. Shylock tem ódio do bom cristão, por razões que não vem ao caso, e resolve pedir-lhe em pagamento, caso não tenha dinheiro para pagar a dívida, uma libra de carne, de qualquer parte do corpo que o agiota escolher. O bom cristão assina o acordo, confiando que terá dinheiro para pagar a dívida. No entanto, seus navios naufragam e ele não tem como pagar. O judeu exige-lhe uma libra de carne do coração.

O que me interessa aqui é o julgamento. O amigo consegue o dinheiro para pagar a dívida em dobro, mas o judeu não aceita receber; quer o coração. O juiz, que na verdade era a esposa do amigo do bom cristão (coisa estranha, mas deixa prá lá) dá ganho de causa ao judeu e o autoriza a tirar o pedaço de carne do coração do devedor.

Antes que ele o faça, o juiz diz que o contrato autoriza o judeu a retirar a carne do devedor, mas que não deve derramar uma gota de sangue. O judeu desiste da vingança, e diz que vai ficar com o dinheiro. O juiz nega-lhe o direito de ser pago e, pior, tira-lhe todos os bens e o dá ao devedor.

Todos comemoram a conclusão do assunto e elogiam a sabedoria do juiz.

Fiquei sem entender. A dívida existia de fato, e não havia sido paga. Mas, pior do que não receber, o judeu perde tudo o que tem para o devedor.

É uma obra literária, eu sei, mas é péssima. No fim das contas, a usura é pecado, coisa que um judeu não sabe, nem pode saber. Afinal, não é cristão. O judeu teve o que merecia, né?

Sunday, January 14, 2007

Em que pensa Deus?

Antes de responder a esta pergunta, é necessário perguntar primeiramente se Deus pensa.

Sim, ele pensa porque é puro pensamento.

Sendo assim, em que pensaria?

Ora, nele mesmo! Em que mais poderia pensar?

Bem, ao menos sabemos que é isto o que pensava Aristóteles (Metafísica 1074b).

Se Deus pensasse em outra coisa que não ele mesmo, haveria o pensamento e o conteúdo do pensamento. Sendo assim, o conteúdo do pensamento seria mais importante que o próprio pensamento. Ora, Deus é puro pensar. Assim, o conteúdo do pensamento de Deus seria mais importante que o próprio pensar - Deus. Isto é absurdo. Logo, como Deus pensa, só pode pensar em si mesmo, ou seja, pensar o pensar.

Pronto! Problema resolvido.

Ninguém precisa pensar mais nisso.

Saturday, January 13, 2007

Didática magna

O primeiro professor da história da humanidade, até onde se sabe, foi o sofista Protágoras de Abdera. Antes dele, a educação estava a cargo de um escravo, o pedagogo, e limitava-se à música, ginástica, aritmética e rudimentos de leitura e escrita. Ainda não havia o estudo da gramática, também uma inovação de Protágoras, e o estudo teórico.

As aulas de Protágoras tinham como objetivo principal a arte de falar em público. Para treinar o aluno, um aristocrata que futuramente participaria das decisões políticas da polis, forjava-se um caso jurídico e o aluno, para concluir os estudos, deveria ser capaz de vencer o professor na disputa verbal.

Um certo aluno, Êuatlos, estava concluindo os estudos e ainda não havia pago os honorários do professor. Protágoras resolveu cobrar a dívida.

"Mas não venci a causa!", respondeu Êuatlos.

Protágoras retrucou:

"Devo receber em qualquer hipótese; se te venci, devo receber porque venci; e, se venceste, devo receber porque venceste".

O aluno respondeu:

"Não devo pagar em nenhum caso. Se perdi a causa, não devo pagar porque perdi; se venci, igualmente não devo pagar porque venci".

Parece que Protágoras não recebeu.

Friday, January 12, 2007

Atmosfera 4

Era de manhãzinha. Tudo estava pronto para a partida em casa de Abraão. Despediu-se de Sara, e Eliezer, o fiel servidor, seguiu-o pelo atalho até o momento em que Abraão lhe ordenou o regresso. Depois, em completa concordância, Abraão e Isaac caminharam juntos até a montanha de Morija. Cheio de paz e doçura, Abraão fez os preparativos do sacrifício, mas, quando se voltou para puxar da faca, viu Isaac que a mão esquerda do pai se crispava de desespero, que um arrepio lhe sacudia o corpo e contudo Abraão puxou da faca.

Regressaram então à casa. Sara precipitou-se ao encontro de ambos. Isaac, porém, já não tinha fé. Nunca de tal coisa se falou no mundo, nem Isaac disse a alguém aquilo que presenciara, nem Abraão suspeitou de que alguém o vira.

Quando chega o tempo do desmame, recorre a mãe à alimentação mais forte para evitar a morte do filho. Feliz aquele que dispõe de alimento forte!

Johannes de Silentio, vulgo Kierkegaard. Temor e Tremor.

Atmosfera 3

Era de manhãzinha. Abraão levantou-se, deu um beijo a Sara, e Sara deu um beijo a Isaac, suas delícias, sua eterna alegria. E Abraão, montado no burro, seguiu pensativo. Meditava em Agar e no filho que abandonara no deserto. Subiu a montanha de Morija e puxou da faca.

A tarde estava tranqüila quando Abraão se achou sozinho em Morija. Jogou-se na terra e pediu perdão a Deus pelo seu pecado, perdão por ter querido sacrificar Isaac, perdão por ter esquecido o dever paternal para com o filho. Tomou, de novo, com mais freqüência o solitário caminho da montanha, mas não encontrou repouso. Não podia conceber que pecara por ter querido sacrificar o seu mais precioso bem, por quem teria oferecido a vida mais de uma vez; e, se pecara, se nunca amara Isaac a tal ponto, não podia compreender como merecer o perdão de Deus — haverá, com efeito, mais horrível pecado do que o seu?

Quando chega o tempo do desmame, a mãe fica triste pensando que ela e o filho se irão separar; que o menino, a princípio sob o seu coração e depois embalado no seio, nunca mais se encontrará tão perto dela. E juntos sofrerão esta curta pena. Feliz aquele que conservou o filho tão perto do seu coração e não teve outro motivo de desgosto!

Johannes de Silentio, vulgo Kierkegaard. Temor e Tremor.

Thursday, January 11, 2007

Atmosfera 2

Era de manhãzinha. Abraão levantou-se, abraçou Sara, companheira da sua velhice, e Sara deu um beijo a Isaac, que a havia preservado do escárnio e era seu orgulho e esperança para toda a posteridade. Caminharam em silêncio. Abraão conservou o olhar obstinadamente fixo no solo até o quarto dia. Só então levantou os olhos e vendo no horizonte a montanha de Morija, baixou-os de novo. Em silêncio preparou o holocausto e ligou Isaac; em silêncio puxou da faca; então viu o carneiro que Deus provera. Sacrificou-o e regressou... A partir desse dia Abraão envelheceu; não pôde esquecer aquilo que Deus lhe exigira. Isaac foi crescendo, mas os olhos de Abraão haviam perdido o brilho; nunca mais tornou a ver a alegria.

Quando o menino, já crescido, tem de ser desmamado, a mãe, pudicamente, oculta o seio e o menino já não tem mãe. Feliz o filho que não perdeu a mãe de outro modo!

Johannes de Silentio, vulgo Kierkegaard. Temor e Tremor.

Wednesday, January 10, 2007

Atmosfera 1

E Deus pôs Abraão à prova e disse-lhe: toma o teu filho, o teu único filho, aquele que amas, Isaac; vai com ele ao país de Morija e, ali, oferece-o em holocausto sobre uma das montanhas que te indicarei.

Era de manhãzinha. Abraão levantou-se, albardou os burros, deixou a sua casa com Isaac, enquanto da janela Sara os via descer pelo vale até se perderem de vista. Caminharam em silêncio durante três dias. Na manhã do quarto dia, Abraão continuou sem dizer palavra, mas, erguendo o olhar, viu ao longe os montes de Morija. Despediu então os servidores e, tomando Isaac pela mão, trepou pela montanha. E Abraão dizia para si: Não posso mais ocultar-lhe aonde conduz este andar. Deteve-se, pousou a mão sobre a cabeça do filho para o abençoar e Isaac inclinou-se para receber a bênção. O rosto de Abraão era o de um bom pai: o olhar doce e a voz exortavam. Mas Isaac não podia compreendê-lo; a sua alma não lograva elevar-se tão alto; abraçou os joelhos de Abraão, jogou-se-lhe aos pés, pediu-lhe piedade, implorou pela sua juventude e pelas mais doces esperanças, falou das alegrias da casa paterna, evocou a tristeza e a solidão. Então Abraão levantou-o, pegou-lhe na mão e caminhou e a sua voz exortava e consolava. Mas Isaac não podia compreendê-lo. Abraão subiu a montanha de Morija; Isaac não o compreendia. Foi então que, tendo-se afastado um pouco do filho, Isaac lhe tornou a ver o rosto, desta vez alterado, o olhar feroz, as feições aterradoras. Agarrou Isaac pelo peito, deitou-o por terra e disse-lhe: Estúpido! Supões que sou teu pai? Sou um idólatra! Crês que obedeço às ordens de Deus? Faço o que me apetece! Então Isaac fremente e com grande angústia, gritou: Deus do Céu? Tem piedade de mim! Deus de Abraão, tem piedade de mim, sê meu pai, porque já não tenho outro na Terra!

Mas Abraão ciciava: Deus do Céu, dou-te graças. Vale mais que me julgue um monstro do que perca a fé em ti.

Quando chega o tempo do desmame, a mãe enegrece o seio, porque manter o seu atrativo será prejudicial ao filho que o deve abandonar. Assim ele acredita que a mãe mudou, embora o coração dela continue firme e o olhar conserve a mesma ternura e amor. Feliz aquele que não tenha de recorrer a meios ainda mais terríveis para desmamar o seu filho!

Johannes de Silentio, vulgo Kierkegaard. Temor e Tremor.

Tuesday, January 09, 2007

A caixa chinesa de Kierkegaard

Um certo indivíduo, que se intitulou Johannes o Sedutor, escreveu um diário contando como seduzira uma jovem ingênua, e o abandonou em uma gaveta. Um outro indivíduo, ou talvez o mesmo, escreveu outros seis livros menores, juntou todos eles, inclusive o Diário do Sedutor, e esqueceu todos os textos em uma gaveta. Um juiz, Guilherme, vasculhando as gavetas, encontrou o material e o leu. Incomodado com o que havia lido, e julgando que todos os escritos pertenciam ao tal Johannes o Sedutor, decidiu que tinha lhe dar uma resposta à altura. Como a premissa fundamental do Sedutor baseava-se na idéia de que a vida ética é entediante e que deve-se buscar a variedade para fugir da monotonia, o Juiz Guilherme lançou-se à tarefa de tentar mostrar ao Sedutor que a vida estética não é outra coisa senão desespero, e que o casamento não é necessariamente tédio. Escreveu três livros, entre eles O Matrimônio, mas, como não tinha meios de enviá-los ao esteta, deixou-os, juntamente com um sermão de um certo sacerdote, na mesma gaveta, para que o Sedutor o encontrasse, quando voltasse para buscar seus papéis.

Isto não aconteceu; o autor anônimo nunca retornou, e os volumes, agora onze ao todo, ficaram esquecidos na gaveta. Então, em um belo dia um encadernador, Bogbinder, encontrou os manuscritos e os reuniu em um único volume. Um editor, Victor Eremita, encontrou os volumes já encadernados, com uma nota explicativa do Sr. Bogbinder. Victor Eremita estudou as caligrafias e concluiu que só havia dois autores: os primeiros sete manuscritos haviam sido escritos pelo tal Johannes o Sedutor - que chamou de A - e os quatro últimos, pelo Juiz Guilherme - que chamou de B. Então, editou a obra, explicando como fora parar em sua mão, mas deixando claro, ao final, que, se os manuscritos podiam ser uma farsa, a sua edição também poderia ser. Portanto, os leitores não podiam ter certeza nem da autoria, nem da história que ele contava, nem do que ele próprio afirmava sobre a edição dos manuscritos, ou mesmo de que fosse realmente o editor, apesar de assinar.

Este é o enredo da obra "Ou ou", de Kierkegaard (ou melhor, de um tal Victor Eremita) e marca sua estréia como filósofo. A obra é extensa e magistral, sobretudo os escritos estéticos. Há um longo ensaio sobre o Don Giovanni, de Mozart; um ensaio sobre o tédio a partir da existência, não sei se real, de uma sepultura em Londres dedicada a um "anônimo"; o Diário do Sedutor, e outras mais.

A obra tomou Copenhague de assalto; especulou-se à exaustão sobre a autoria. Kierkegaard estava na lista dos suspeitos e, para negar que fosse o autor, escreveu um artigo para jornal intitulado "Quem teria escrito Ou, Ou?", em que levantava hipóteses sobre os literatos de Copenhague: "Teria sido fulano?" "Não, fulano não poderia ser por esta e esta razão" etc.

Deve ter-se divertido bastante com a panacéia. A oportunidade era perfeita para ironizar a "elite intelectual" de sua cidade, e ele não deixou por menos.

Monday, January 08, 2007

Filosofia revelada

Havia, na Copenhague da primeira metade do século XIX, um certo Johan Ludvig Heiberg (1791-1860), escritor, historiador, teatrólogo e crítico de arte de grande expressão local. Era filho de escritores e casou-se com uma atriz. Inicialmente o filósofo Kierkegaard mantinha boas relações com ele, até o momento em que publicou sob pseudônimo o livro "Ou, ou" e a comunidade local julgou que Heiberg fosse o autor. Heiberg, para negar com veemência a autoria, disse que jamais escreveria "um livro monstruoso como aquele". Quando Kierkegaard publicou "A Repetição", novamente sob pseudônimo, Heiberg outra vez deixou claro que não era o autor e que o livro não tinha qualquer valor. Mas a briga se tornou mais acirrada quando, em um belo dia, Heiberg "acordou hegeliano".

A julgar por Kierkegaard, Heiberg, em uma bela manhã de Páscoa de 1822, "levantou-se para compreender a filosofia de Hegel". Tivera, em sonhos, a revelação da filosofia hegeliana. A partir de então tornou-se seu grande apóstolo.

Apesar da ironia, parece que Heiberg realmente alegou ter tido a comprensão de Hegel como se fosse uma revelação.

Mais tarde, a esposa de Heiberg representou Julieta, aos quarenta anos, na peça de Shakespeare, e Kierkegaard não deixou por menos: publicou um artigo sobre a peça, intitulado "A Crise e a Crise na vida de uma atriz" (1848), em que afirmava que somente na maturidade a atriz poderia de fato representar Julieta, porque a lembrança de sua juventude não estava disponível nas performances... da juventude.

Trocando em miúdos: a sra. Heiberg está velha para o papel de uma jovenzinha de 15 anos, mas isso não é problema porque podemos nos lembrar dela quando jovem, ou imaginar como teria sido, o que seria impossível quando ela era jovem.

Sunday, January 07, 2007

A utilidade dos camelos, segundo Kant

Poderíamos perguntar o que seria dos beduínos sem o camelo, mas parece que o filósofo alemão Immanuel Kant se pergunta o que seria dos desertos sem o camelo.

Como é perfeita a natureza! Inventou o deserto, mas logo tratou de criar o camelo para viver nele, caso contrário não haveria utilidade nem para um, nem para outro. Utilidade para os homens, bem entendido, porque a natureza está aí apenas para servir aos nossos propósitos. Caso contrário, por que existiria, né?

Que coisa. Até tu, meu rei?

"É também digno de admiração que os desertos de areia contem ainda com o camelo, que parece ter sido criado para a sua travessia, para os não deixar inutilizados". (Kant, A Paz Perpétua, p.143).

Saturday, January 06, 2007

Bando de filósofos

"Não é de esperar nem também de desejar que os reis filosofem ou que os filósofos se tornem reis, porque a posse do poder prejudica inevitavelmente o livre juízo da razão. É imprescindível, porém, para ambos que os reis ou os povos soberanos (que se governam a si mesmos segundo as leis de igualdade) não deixem desaparecer ou emudecer a classe dos filósofos, mas os deixem falar publicamente para a elucidação dos seus assuntos, pois a classe dos filósofos, incapaz de formar bandos e alianças de clube pela sua própria natureza, não é suspeita da deformação de uma propaganda" (Immanuel Kant, A Paz Perpétua, Edições 70, p. 150).

Hmmm. Em teoria, talvez, mas no dia-a-dia não sei não. A classe dos filósofos - ao menos os filósofos acadêmicos - é capaz, sim, de formar bandos e alianças de clube, embora seja verdade também que o individualismo próprio do ofício torna frágeis essas alianças. Mas, é claro, a filosofia, por sua própria natureza, não convive bem com o poder, porque não pode, por força de negar a si mesma, sobrepor o poder ao saber.

Friday, January 05, 2007

De Kant, sobre Lula

Posso pensar, sem dúvida, um político moral, isto é, um homem que assume os princípios da prudência política de um modo tal que possam coexistir com a moral, mas não posso pensar um moralista político, que forja uma moral útil às conveniências do homem de Estado.

Immanuel Kant, A Paz Perpétua, Edições 70, p. 153.

Estatística estranha

A julgar pelo levantamento feito, a Suécia é o país com maior número de ateus e agnósticos do planeta: entre 46 e 85% da população. Isso não é novidade. A surpresa é o segundo colocado, o Vietnã, com 81%. Nos Estados Unidos, há entre 3 e 9% de ateus. Menos que na China, que tem cerca de 14%.

O Brasil nem chega a ser incluído na estatística.

Thursday, January 04, 2007

Nem tudo está perdido

Que a filosofia não tenha espaço no mercado de trabalho, é coisa sabida. Que os cursos de filosofia remanescentes, os poucos de universidades católicas, estão fechando as portas, também não é novidade. Quem é da área e leciona em uma universidade dedicou-se aos estudos anos a fio, em muitos casos doutorando-se, mas a situação em que se encontra hoje, em termos profissionais, é péssima. De um lado, aulas esparsas em faculdades particulares, sob a ameaça eterna de desemprego. De outro, universidades públicas de difícil acesso, com poucos concursos e grande demanda. Em meio a isso tudo, políticas educacionais que reduzem as grades curriculares a conteúdos mínimos, voltados para o mercado de trabalho, e que praticamente excluem a filosofia.

Mas, ao que parece, surgiu uma alternativa: empresas americanas estão começando a contratar filósofos como consultores, com o propósito de humanizar as relações de trabalho e atuar em planejamento.

Por enquanto é só uma tendência que, espero, o Brasil copie. Mas acho que vamos ter de esperar muito para ver isso acontecer, se acontecer.

Wednesday, January 03, 2007

DNA de Cristo

Enfim, tudo resolvido: os cientistas já podem ter o DNA de Cristo. Isso é fantástico, porque a ciência detém hoje o lugar de estatuto da verdade. Provada cientificamente a existência histórica de Jesus, o resto fica fácil.

Mas onde está o DNA de Cristo?

Ora, no corpo dele!

Eu explico.

Cristo reencarnou em 1948, em uma aldeia no interior de Santa Catarina, e o melhor da história é que ele ainda vive. Por que você não aproveita para garantir a aposentadoria? Basta seguir o homem, esperar um momento de distração e puxar um fio da barba. Pronto, já tem o DNA. Imagine o quanto pode valer, quando ele tiver passado desta para melhor.

É verdade que, para Cristo reencarnar em INRI Cristo, o corpo terá de ser outro. Portanto, o DNA é outro. Mas isso não é problema, porque afinal de contas ele continua sendo Cristo. Lembre-se do que diz o próprio INRI Cristo, citando Nelson Rodrigues: "o óbvio ululante não carece de prova".

Acho que devíamos fazer um esforço para levar Cristo a sério desta vez; só assim ele pára com essa história de reencarnar. Se parar, seu fio de barba valerá uma pequena fortuna.

Pena que nesta reencarnação não guardaram o cordão umbilical.

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Cá entre nós: gaste um pouquinho de seu tempo para visitar a página linkada no título, ouvir o Messias e ler um pouco de sua história. Funciona como vacina contra febre amarela.

Tuesday, January 02, 2007

A importância histórica de um nariz

Sabe aqueles eventos únicos, capazes de mudar o destino do mundo, de alterar o curso do planeta, de interferir nas marés, de modificar tudo à sua volta? Pois é, parece que Pascal (Pensamentos, 162) julgava ser este o caso do nariz de Cleópatra:

"Se o nariz de Cleópatra tivesse sido mais curto, toda a face da terra teria mudado".

Um tantinho exagerado, não? Mas talvez ele esteja querendo dizer que, se o nariz de Cleópatra fosse mais curto, Otávio também teria se apaixonado por ela. Ou talvez nem Júlio César, nem Marco Antônio. Vá saber. Em qualquer destes casos a história da humanidade seria outra.

Lembrei de Obelix (aquele que caiu na poção mágica de Panoramix quando criança), pendurado no nariz da Esfinge (acho que era a Esfinge): se Cleópatra não tem mais nariz, e o mundo é o que é, a culpa é dele.